quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

O uso de filmes para incrementar as aulas de biologia

hoje fui convidada para falar sobre a minha dissertação de mestrado intitulada “A Ciência e o cientista através da janela mágica – estudo de caso com o filme Sonhos Tropicais”  e aproveitei para escrever sobre essa experiência. Uma das principais motivações dessa pesquisa é que para mim, o cinema é o entre-lugar de trabalho, da diversão e do aprendizado: como professora de  biologia, procuro levar os meus alunos para curtir e pensar o cinema. Essa prática me aproximou de pessoas que fazem, exibem ou pesquisam cinema. Em Belo Horizonte e no Rio atuei como assessora pedagógica de projetos que levam alunos ao cinema e observei que não é comum que os meus colegas professores de ciência e biologia levem seus alunos uma sala de cinema, como acontece regularmente com profissionais que atuam no ensino de história, literatura e outras áreas. Talvez um dia esse problema seja melhor investigado e, oxalá no futururo ocorra a inclusão de uma disciplina ligada ao cinema , ou ciência e arte, nos cursos de formação dos professores de biologia. Afinal, existe uma gama de opções de filmes que representam a ciência e o cientista - um dos anexos da minha dissertação traz uma coletânea com imagens e informações de 78 filmes que apresentam esse enfoque. Quem quiser pode solicitar por e-mail e eu envio essa coletânea, porque ela foi construída para que outros educadores se interessem em analisar alguns desses filmes com seus alunos. Posso também publicar o relato dessas experiências aqui no blog.
 
Minha  pesquisa foi realizada no Instituto Oswaldo Cruz com a orientação da Dra. Luisa Massarani.  
Nesse trabalho sugerimos o uso de filmes para tornar a aprendizagem de biologia ainda mais instigante. A princípio pensávamos em promover sessões  e análise de cinco filmes dirigidos por cineastas brasileiros que representam a ciência ou o cientista: "Houve uma vez dois verões", "Diários de Motocicleta", "Bufo & Spallanzani"  e "Narradores de Javé" , mas quando nos deparamos com a quantidade de questões presentes no filme "Sonhos Tropicais", resolvemos concentrar as forças na análise dessa obra.
 
O filme "Sonhos Tropicais" lançado em 2002 é dirigido pelo  cineasta André Sturm. Vale ressaltar que a escolha de um filme brasileiro foi proposital para que, a partir da nossa realidade refletida na tela, pudéssemos estimular o interesse dos jovens pelos filmes brasileiros e discutir a ciência que é produzida no Brasil. "Sonhos Tropicais" traz questões  atuais como a crise na saúde pública e a exploração sexual de mulheres, retratando um momento de intensa crise na saúde do Rio de Janeiro no início do século XIX. Nesse período, a cidade era conhecida como “Túmulo dos Estrangeiros” porque os navios estrangeiros evitavam atracar no Brasil pelo medo das chamadas “doenças tropicais”. É claro que essa situação comprometia a economia do país, que nesta época estava concentrada na produção e exportação do café. Para enfrentar o problema, o então presidente, Rodrigues Alves, convidou o cientista Oswaldo Cruz para combater as principais epidemias que afastavam os investidores estrangeiros: febre amarela, peste bubônica e varíola. Ao mesmo tempo, o governo promovia uma intensa reforma arquitetônica. Assim, os cortiços passam a dar lugar aos palácios e avenidas, como resultado, boa parte da população foi violentamente desabrigada. Essa população insatisfeita se uniu aos opositores do governo Rodrigues Alves para contestar suas ações, inclusive as medidas de saneamento propostas por Oswaldo Cruz. O auge da crise é a proposta da vacinação obrigatória que resultará na “Revolta da Vacina”. 
 
Apesar da relevância histórica e científica desse episódio, ele ainda é pouco estudado nas aulas de biologia do ensino médio, mas a lição que ele traz é fundamental: a importância do envolvimento da população nas ações de saúde. Outro assunto que lamentavelmente ganha pouco espaço no ensino de biologia é a história dos cientistas brasileiros. Por isso, concluímos que a exibição desse filme seria oportuna para trazer essas discussões.  
Além de representar a Revolta da Vacina, o filme narra o drama das polacas, jovens judias de origem polonesa, trazidas para o Brasil com uma falsa promessa de casamento que acabam exploradas nos bordeis. Por isso o filme pode ser oportuno para os educadores que consideram as aulas de biologia um espaço para refletir e combater ações que violam os direitos humanos como a exploração sexual de mulheres e crianças, tão comum na nossa contemporaneidade.

Para saber como os jovens reagiriam às densas questões tratadas no filme, contamos com dois grupos colaboradores. O primeiro grupo era formado por jovens que atuam como monitores no Museu da Vida. Eles vivem em situação de risco social e moram nas adjacências da Fundação Oswaldo Cruz. O segundo grupo foi formado por alunos de uma escola privada: a escola Parque-Barra. Embora em situações sociais opostas, esses jovens tinham em comum o fato de cursar ou já haver cursado o ensino médio. Nossos colaboradores assistiram ao filme, participaram de um grupo focal, onde foram estimulados a discutir os temas tratados no filme, de acordo com o interesse de cada grupo. Por exemplo, o grupo do Museu da Vida revelou intensa identificação com a situação de pobreza da população que se rebelava contra a vacina e com a precariedade dos serviços públicos oferecidos a essa população. Já o grupo da Escola-Parque mostrou-se mais sensibilizado com o drama das polacas. Para que pudessem se expressar individualmente, cada jovem preencheu um questionário. Além disso, realizamos um júri simulado a fim de que cada grupo vivenciasse uma imersão na história e avaliassem a responsabilidade dos cientistas em uma crise de saúde pública. Toda essa participação foi gravada posteriormente transcrita na íntegra.  
Analisamos o conteúdo desse material usando métodos qualitativos e exploratórios, por isso, os resultados obtidos com esses grupos de jovens não podem ser generalizados para a totalidade dos jovens brasileiros, mas esse estudo permite apontar tendências sobre o uso do filme “Sonhos Tropicais” entre jovens. Nossos resultados mostram que o filme promoveu uma discussão calorosa de temas como a história da ciência brasileira, em especial a vida e a obra de Oswaldo Cruz e a Revolta da Vacina e permitiu uma reflexão sobre o problema da exploração sexual no Brasil e no exterior. De acordo com o relato dos jovens, a participação na pesquisa favoreceu a apropriação de conhecimentos apresentados no filme e nas literaturas que disponibilizamos nos encontros que promovemos com os grupos.
Além do trabalho desenvolvido com esses jovens, a pesquisa me aproximou dos autores  do livro e do filme "Sonhos Tropicais", de pesquisadores que atuam com cinema e educação, de exibidores que promovem sessões para escolas e de professores que usam a sala de cinema como espaço de aprendizagem. O trabalho traz na íntegra as entrevistas que realizamos com o escritor Moacyr Scliar, que é autor da obra original, com André Sturm, o diretor do filme Sonhos Tropicais, com Rosália Duarte que é pesquisadora da PUC e autora do livro “Cinema e educação” e com Felicia Krumholz, então coordenadora do projeto Cine-Escola do Grupo estação. Tais entrevistas permitiram o mapeamento das motivações que levaram à criação da história e à adaptação do romance para as telas de cinema. Também permitiram que discutíssemos estratégias de ensino através da sétima arte, tanto no ensino formal como no não formal. De certo modo, partimos da gênese da narrativa “Sonhos Tropicais”, percorremos o seu trânsito do texto para a tela e observamos a percepção e a aprendizagem a partir dessa obra. 
O compartilhamento dos resultados do meu trabalho depende de espaços de divulgação e como esses espaços são restritos uso o blog para fazer um apelo aos coordenadores dos cursos que formam professores de ciências e biologia para que ofereçam aos futuros educadores a qualificação necessária para explorar a ciência e o cientista no cinema e em outros recursos que possam ampliar o interesse dos jovens pela ciência. Afinal, o cinema encanta e desperta o interesse dos jovens. Por isso, sempre que for possível apresentar a ciência e o cientista através da janela mágica, a aprendizagem será ainda mais significativa e prazerosa. 

O poder público poderia dar uma forcinha ao investir os recursos públicos destinados ao cinema de forma equitativa  nas áreas de pesquisa, produção e educação Mas infelizmente, muito pouco dos recursos destinados a esse setor são direcionados para o trabalho de formação de público.  Em função disso, não há uma política de formação de espectadores críticos. Se essa pesquisa, de algum modo, colaborasse para mudar essa realidade, seria fabuloso.

14 comentários:

Ronald disse...

oi!
sou professor de Biologia na cidade de Vitória/ES. gosto muito de cinema e uso sempre que posso em minhas aulas; gostaria de receber a coletanea de informações de filmes; e sua dissertação, está disponível em algum site para leitura: me interessei muito em conhecer
Ronald Alves
ronaldsalves@hotmail.com

Elaine disse...

Olá, gostaria de receber a lista dos 78 filmes que você comentou
Obrigado

rose disse...

Prezada professora Silvânia, boa tarde. por gentileza, poderia me enviar a coletânea de filmes?
Busquei na internet e encontrei um arquivo com sua Dissertação de Mestrado que apreciei muito ler (http://www.museudavida.fiocruz.br/brasiliana/media/dissertacao_silvania_santos.pdf), contudo, nesse arquivio, nos anexos, da página 103 pula-se para a página 143. Desse modo não tive acesso à referida coletânea.
Aguardo retorno, obrigada.
Rose

rose.oliveira37@gmail.com

O caminho para a vida boa disse...

Olá, como posso conseguir a lista dos 78 filmes em questão. Sou estudante de Biologia e preciso realizar um trabalho com filmes.
Agradeço sua atenção.
Gisele
e.gisele.martins@hotmail.com

Anônimo disse...

Olá gostaria de ter acesso a lista dos 78 filmes que mencionou, sou estudante de Biologia e preciso realizar um trabalho com esse tema.
Obrigada pela atenção
Gisele

e.gisele.martins@hotmail.com

SILKS! disse...

OLÁ,SOU ESTUDANTE DE BIOLOGIA E ME INTERESSEI MUITO POR ESSE TEMA PARA FAZER MEU TCC, GOSTARIA DE RECEBER A COLETANEA DE INFORMAÇÕES DE FILMES....
silmariajijoca@hotmail.com

SILKS! disse...

gostaria de receber por email a lista de filmes
slmariajijoca@hotmail.com

Priscila Wilker disse...

Olá, também gostaria de receber a lista dos 78 filmes que você comentou
priscila.wilker@yahoo.com.br
Obrigada

Ana Carolina disse...

Olá, também gostaria de receber a lista dos 78 filmes que você comentou
carolbs_0909@hotmail.com

Lírit Yautja disse...

Boa Noite Silvânia.

Meu nome é Nathália Lima e sou graduanda em Biologia pela UFRJ. Gostaria de receber a coletânea de filmes que você menciona em seu trabalho.

Obrigada.

lirit@ufrj.br
nathaliadbz@hotmail.com

Anônimo disse...

Gostaria de receber a lista de filmes pelo email danislei@seed.pr.gov.br. Obrigado.

Anônimo disse...

Gostaria de receber a lista de filmes pelo email danislei@seed.pr.gov.br
Obrigado

Danilo Benette Marques disse...

Gostei bastante do texto e li parte da sua monografia, muito apreciável, mas também gostaria que nos mandasse a lista dos 78 filmes, se possível! Muito obrigado :)

danilobenette@gmail.com

Anne Eveline disse...

Oi, gostaria de receber a lista de filmes que você utilizou no seu mestrado. Poderia mandar por e-mail.Obrigada.
anneevelinesoares@yahoo.com.br