quinta-feira, 22 de julho de 2010

Na escrita, menos é mais

Consegui uma vaga no disputado curso adaptação, literatura e cinama, na Caixa Cultural e esse é o relato da aula do pernambucano Marcelino Freire, autor de livros como "Era o dito", "Contos negreiros" e "Os Cem menores contos brasileiros do século".

Marcelino é apaixonado por textos que dizem muito, usando poucas palavras e é especialista em ensinar a arte de escrever com concisão e clareza.

Marcelino começou analisando vários microcontos e apresentou características que conferem a esses textos o status de literário. Para Marcelino, um texto literário é aquele que fere ao ser lido. Marcelino nos contou como foi picado pela literatura quando leu, aos nove anos, "O Bicho" de Manoel Bandeira.

O primeiro microconto analisado foi o de Augusto Monterroso:

"Quando acordou, o dinossauro ainda estava lá."

Quantas interpretações são possíveis para esse dinossauro? Essas interpretações conferem ao leitor a possibilidade de voar ao encontro de uma segunda história.

Nos microcontos, como na literatura, interessa o que não está escrito. Como é o caso desse texto de Ernest Hemingway:

"Vendem-se: sapatos de bebês
nunca usados."

Resta-nos a sombra da dúvida: quem é esse bebê?

Marcelino Freire nos deu várias dicas para escrever bem:


Evite usar um sistema literário que não te pertence: tire a gravata para escrever;
Reconheça as suas deficiências: se não tiver fôlego para escrever grandes períodos, opte por frases curtas;
Prefira os travessões quando for usar diálogos. As aspas podem confundir o leitor, principalmente se você esquecer de fechá-las;
O título e o uso de reticências merecem atenção, porque são elementos literários;
Defina a alma dos personagens porque é ela quem dará vida e clareza ao seu texto;
Escrever é desenhar na tela: um espaço entre linhas e fontes agradáveis tornam a leitura agradável;
Busque o olho do leitor: dispondo elementos importantes do texto no lado esquerdo da página.
Ao apresentar seus textos, não esqueça de colocar o seu nome para evitar que a sua produção se transforme em domínio público.

Marcelino, que já foi revisor de textos, apontou algumas pragas recorrentes na escrita:

- o uso do ponto de exclamação ou interrogação seguido de: "exclamou ele" ou "perguntou ele";
- o excesso de advérbios e adjetivos que tornam o texto falso;
- os pretérito mais que perfeito ou verbos no infinitivo (a pular, a gritar).

Para Marcelino, o autor deve procurar a "respiração de afogado" e escrever sobretudo o que ele escuta. Ele também recomenda que o texto seja lido em voz alta para facilitar o corte dos excessos.

Para os que pretendem lançar o primeiro livro, Marcelino adverte: livro não é um depósito: "escritores estreantes adorariam que seu primeiro livro fosse uma antologia". Analise seus textos de forma crítica, buscando entender o que os contos ou poesias que você escreveu têm em comum.


Marcelino encorajou a turma a escrever e ler microcontos de apenas seis letras. Ao ouvir a produção da turma ele destacou que escrever pode ser um jogo que, por ser divertido, pode vencer bloqueios. Para ele, a literatura se vence na distração. Que tal se expressar através da escrita? Não se esqueça de fugir das formalidades!

domingo, 18 de julho de 2010

Novo curso de Interpretação

Para quem gostou das cenas que eu gravei e do relatório que publiquei aqui sobre as aulas de Alexandre Klemperer, uma excelente notícia:

sexta-feira, 9 de julho de 2010

O que será do futuro do filho do jogador mais falado no Brasil?




Minha dor é perceber, que apesar de termos feito tudo o que fizemos, ainda somos os mesmos e vivemos... como os nossos pais.
                                                      Belchior







Ele se achava o tal: ídolo da torcida, quase um deus, conquistou o reconhecimento até dos adversários e se transformou no sonho de consumo de times estrangeiros. Com tanto poder, nem se lembrava dos tempos difíceis e do drama de uma infância sem a mãe. Se casou com um mulher quase santa a ponto de...bem, ao ponto de ela compreende-lo quando ele dizia em rede nacional que "bater em mulher é normal". Agradecida por ser esposa, ela perdoou as amantes: esse deslize era necessário para aplacar a fome de esperteza que ele e seus amigos cultivavam. Assim, eles usaram muitos corpos, até que um dia decidiram se livrar de um corpo que pareceu ser inútil ou inadequado.

Ele, que se convenceu estar acima do bem e do mal ou o melhor do mundo, dorme ou tenta dormir em uma cela comum: sozinho, ou melhor com a bíblia. Seus ex-fãs assistem incrédulos os detalhes sórdidos do crime que mudou o rumo da história do talentoso atleta. Agora ele não precisa fazer o menor esforço para aparecer: perseguido pelos repórteres, sedentos de detalhes tanto mais sórdidos quanto vendáveis.

Esse enredo, amplificado pela voracidade da imprensa não mudará apenas a história do nosso anti-herói. Há um bebê nessa história - o que será dessa criança quando terminar o tempo de inocência? Como aplacar as sequelas quando ele tomar consciência da crueldade que seu pai cometeu, dos caminhos tortuosos que a mãe e o avô percorreram? O pequeno filho construirá uma história diferente onde o caráter supere a esperteza?  Enquanto a sociedade consome as reportagens sangrentas deveria se perguntar o que pode ser feito para  essa e outras crianças que vivem dramas familiares intensos não reproduzam a história de seus pais.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Professor Miserável?

Hoje recebi uma imagem-piada sobre o professor e tive vontade de escrever sobre ela.



Tenho quinze anos de magistério e, felizmente, não me reconheço na figura miserável acima. Parte da minha sorte está no fato de eu não manter minha família sozinha e... confesso... de meu marido não ser professor também. Mas há outras razões para não me sentir uma desgraçada: sou professora por paixão e por opção. Na época de faculdade, fui estagiária em laboratórios de análises clínicas, pesquisei repelentes naturais, estive no projeto TAMAR.... mas o local que eu escolhi ficar foi a sala de aula. Educar é árduo sim, mas também gratificante.Bom seria se a gratificação que sentimos ao participar ativamente da construção do conhecimento refletisse também em excelentes salários.

Todo professor deveria ganhar muito bem e trabalhar pouco.  A sociedade deveria enxergar o mestre como um modelo e não como um pobre coitado. Como resolver esse dilema: educadores devem ser cultos, mas cultura custa caro? Alguns políticos propuseram "vales", mas mantiveram o salário baixo- o educador recebe um bilhetes para frequentar cinema e teatro ou comprar livros. Alguns profissionais se ofendem com tal política e dizem que não precisam de esmolas.  Outros reclamam que a rede estadual e municipal pagam salários baixíssimos mas continuam se submetendo e levando a revolta para a sala de aula.  Não consigo entender porque os concursos para professores desses órgãos têm tanta procura. De um lado, os colegas que abandonaram o magistério - há os que preferem vender biscoito Globo, de outro os que lamentam, destratam alunos ou fingem que ensinam.

Os jovens que estão escolhendo uma profissão deveriam olhar para seus educadores e ver pessoas realizadas. Para isso, não basta que seus mestres sejam melhor remunerados. Até porque nem todos os professores reclamam do salário. Há escolas que pagam um pouco mais e, por isso, exigem tanto de seus mestres que também os tornam miseráveis. A avalanche de atividades que esses profissionais enfrentam impedem que eles convivam com os filhos, os parceiros, os amigos.... Com tanto trabalho, quando esses profissionais poderão fazer um programa diferente e divertido? Talvez esses possam consumir produtos culturais, mas não podem desfrutá-los porque a sobrecarga do trabalho não permite.

Por isso, recomendo aos meus colegas professores que invistam em novas profissões-paixões como culinária, teatro, pesquisa... Assim, espero que no futuro eles consigam viver com qualidade mantendo uma carga-horária pequena, apenas nas escolas que remunerarem bem, sem exigir desenfreadamente. Ao mesmo tempo, torço para que no futuro o magistério possa ser uma opção de trabalho reconhecida, sobretudo por quem nos governa ou dirige a escola. O que mais importa é que meus colegas não se identifiquem com a imagem do professor miserável -  por receber baixo salário ou  negligenciar a família e os amigos.